
Ex-presidente de facto e um dos principais
articuladores do golpe de Estado de 2016, com a queda da presidenta Dilma
Rousseff (PT), o advogado Michel Temer (MDB) sinalizou, na quinta-feira, que
está prestes a desembarcar do apoio ao ex-mandatário neofascista Jair Bolsonaro
(PL). Um dos aliados mais caros ao extremista da ultradireita, Temer afirmou
que aprovar o Projeto de Lei (PL) da Anistia aos envolvidos nos atos golpistas
de 8 de janeiro de 2023 seria como uma afronta ao Supremo Tribunal Federal
(STF).
O causídico prefere uma solução construída
diretamente no âmbito do Judiciário, sobretudo no que diz respeito à dosimetria
das penas impostas aos condenados. Segundo observou, em entrevista à mídia
conservadora nesta quinta-feira, há um ambiente favorável entre os ministros do
STF para a revisão das punições.
— Percebo que há uma boa vontade para isso — avalia.
‘Perdeu, mané”
Mas uma medida nesse sentido não
beneficiaria Bolsonaro, que sequer foi condenado ainda e que, por ser apontado
como líder da intentona golpista, não deve ser beneficiado com o abrandamento
das penas.
A boa vontade para reavaliar as penas
aplicadas aos réus já condenados, segundo Temer, está implícita na decisão mais
recente do ministro Alexandre de Moraes, que concedeu prisão domiciliar à
cabeleireira Débora Rodrigues dos Santos. Ela se tornou conhecida por pichar a
frase: “Perdeu, mané”, na estátua da deusa Têmis, em frente ao prédio do
Supremo, durante os ataques de 8 de janeiro.
A mudança no regime prisional ocorreu em
março, e o julgamento do caso de Débora deve ser retomado em 25 de abril, após
pedido de vista do ministro Luiz Fux. Moraes, responsável por decisões-chave em
relação aos atos antidemocráticos, foi indicado ao STF pelo próprio Michel
Temer em 2017.
Com a experiência de quem colaborou de
forma efetiva para um golpe de Estado perpetrado pela maioria do Legislativo,
com anuência do STF, Temer acredita que uma estratégia articulada entre os
presidentes da Câmara, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB); e do Senado, Davi
Alcolumbre (União Brasil-AP), junto ao Supremo, seria o caminho mais eficaz
para evitar o acirramento entre os Poderes. O entendimento já em curso nos
bastidores deveria vir a público, segundo o advogado.
Risco
Para a ministra da Secretaria das Relações
Institucionais (SRI), Gleisi Hoffmann, em linha com o pensamento de Temer, a
proposta também representa um risco real de institucionalização de um “golpe
continuado” no país, uma vez que oferece perdão generalizado para crimes
relacionados aos ataques golpistas de 8 de janeiro de 2023.
— Sou contra o projeto de anistia —
declarou Hoffmann, em entrevista concedida a um canal de TV por assinatura, na
noite passada. A ministra revelou, ainda, que conversou com diversos deputados
da base aliada que assinaram o requerimento de urgência do projeto.
Muitos deles admitiram não conhecer o conteúdo da proposta.
— Exerci o benefício da dúvida e fui conversar com os deputados. Muitos me disseram que não conheciam e acharam que era um texto de redução de penas que atingiria pessoas do 8 de janeiro, como um pipoqueiro, a moça do batom. Mas quem faz redução da pena não é o Congresso, é o Poder Judiciário — concluiu.